quarta-feira, 12 de abril de 2023

MONOGRAFIA: COOPERATIVA DO PRATA.


      UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBERLÂNDIA

                       INSTITUTO DE HISTÓRIA










A COOPERATIVA DOS PRODUTORES RURAIS

DO PRATA: COOPERATIVISMO E CAPITALISMO.










  

JOÃO DONIZETI ALVES TEODORO

JOÃO DONIZETI ALVES TEODORO




  











A COOPERATIVA DOS PRODUTORES RURAIS

DO PRATA: COOPERATIVISMO E CAPITALISMO.




Monografia apresentada ao Curso de Graduação em História, do Instituto de História da Universidade Federal de Uberlândia, como exigência parcial para obtenção do título de Bacharel em História sob a orientação da Profa. Dra. Heloisa Helena Pacheco Cardoso.










Uberlândia, Julho de 2004



                     AGRADECIMENTOS




            Muitas pessoas me incentivaram para que hoje eu estivesse realizando esse trabalho.

            Primeiramente quero agradecer meus avós, Neorcio Teodoro de Assunção e Maria Matista Rezende Nunes Teodoro (in memorian) que foram quem me matricularam na primeira escola.

            À Profª. Heloisa Pacheco que me orientou neste trabalho.

            Ao profº. Sergio Paulo pelo seu estímulo ao trabalho de pesquisa.

            Aos meus entrevistados, Sr. Pedro Assunção Queiroz, Valdenir Gouveia, João Camilo, Jair Lima Arantes, Maria Batista Teodoro, Ronaldo Rodrigues, Riel Morais da Silveira e Sergio Medina.





                                      SUMÁRIO


CONSIDERAÇÕES INICIAIS

CAPÍTULO 1 – A COOPERATIVA E SUA IMPORTÂNCIA PARA O MUNICIPIO.    

CAPÍTULO 2 – A HISTÓRIA DA COOPRATA.

CAPÍTULO 3 – ESTRATÉGIAS E RESISTÊNCIAS DOS COOPERADOS.

CONSIDERAÇÕES FINAIS.

FONTES

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS




           



                                      CONSIDERAÇÕES INICIAIS

            Como professor sempre me preocupei com assuntos ligados à educação. O meu pré-projeto, feito em Métodos e Técnicas de Pesquisa em História  sob a orientação do Profº. Dr. Newton D’Angelo, tinha como tema o Ensino de Moral e Cívica, disciplina criada no período militar. Quando comecei a monografia, sob a orientação do Profº. Sérgio Paulo, não consegui desenvolver a contexto esse tema. Parecia-me que tudo já havia sido dito pelos estudiosos, como Selva Guimarães FONSECA, Maria Inês S. de SOUZA, Maria Elizabete XAVIER, Demerval SAVIANI, Moacir GADOTTI, Silma do Carmo NUNES, Maria Inês Lemos SOARES e outros1.
            Então pensamos na possibilidade de deixar de questionar o ensino e voltar-nos para algo que muito nos chamara a atenção: os problemas dos produtores rurais, principalmente dos produtores de leite do município do Prata. A cidade do Prata, juntamente com o seu município, possui uma população de 23.424 habitantes2 e área de 4.760 km2, a maior do Triângulo Mineiro e a terceira de Minas Gerais. Possuímos uma das maiores bacias leiteira do Brasil.


         Na década de 80, como produtor rural, forneci leite para a Cooperativa dos Produtores do Prata, onde convivi com os problemas sofridos pelos tiradores de leite. Fiz parte do Conselho Fiscal da Cooprata e relacionei-me com muitos produtores. Participei de alguns concursos leiteiros e cheguei a alcançar o segundo lugar em 1986, o que me fez mais popular entre os produtores rurais.

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1 FONSECA, Selva Guimarães. Caminhos da História Ensinada. São Paulo: USP, 1991 (Dissertação de Mestrado, anos 70 e 80).  GADOTTI, Demerval. Política e Educação no Brasil. São Paulo: Cortez, 1987.
NUNES, Silma do Carmo. Concepções de Mundo no Ensino de História de 5ª a 8ª séries na Escola Estadual em Minas Gerais, 1959-1979. Uberlândia: EDUFU, 1993 (tese de Mestrado). SAVIANI, Demerval. Política e Educação no Brasil. São Paulo: Cortez, 1987. SOUZA, Maria Inês Salgado de. Os Empresários e a Educação: O IPES e a política educacional após 1964, Petropoles: Vozes 1981. XAVIER, Maria Elizabete. Capitalismo e escola no Brasil: a constituição do liberalismo em ideologia educacional e as reformas de ensino (1931-1961). São Paulo. Papirus, 1990.
2 IBGE. Recenseamento de 2002.



            Como o profº. Sérgio Paulo teve que se afastar da UFU pelos seus compromissos acadêmicos com o doutorado, procurei orientação com a Profº. Dra. Helena Pacheco Cardoso com a qual havíamos estudado a disciplina História do Brasil IV. Sob sua orientação iniciei, no final do ano 2003 e início de 2004, a busca das fontes e fui deliberando os caminhos de pesquisa que atendessem às minhas inquietações.

            Na Cooprata pouca coisa foi conseguida: algumas revistas informativas, um estatuto; no entanto fiz uma entrevista com o Gerente Administrativo, Sr. Valdenir Gouveia de Moura, que muito me ajudou.

            Parti então para as entrevistas. Foram gravadas, apenas 8 (oito), porém muito significativas e heterogêneas. Algumas pessoas não quiseram participar, como um funcionário da Cooprata que marcava horário, mas não aparecia. Porém, teve produtor que queria participar para manifestar suas contrariedades com a Cooprata. Achei melhor escolher produtores para serem entrevistados em condições e lugares diferentes, para tentar me aproximar o máximo das realidades individuais vividas por eles: “Realidade que nos próprios captamos e que exploramos por um esforço de inteligência estritamente pessoal”1. Assisti algumas vezes reuniões nas comunidade para me inteirar dos principais problemas do tirador de leite. Cheguei a viajar mais de 50 km para fazer entrevista com pequenos produtores. Os produtores maiores foram entrevistados nas suas residências na cidade do Prata.

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1 BLOCH, Marc. Apologia da História ou o Ofício de Historiador. Rio de Janeiro: Zahar. p, 72


 
            Procurei descobrir e recolher os informativos que os produtores guardavam em suas casas: foram mais de quarenta revistas publicadas pela Cooprata. As mais antigas datam de 1985. As revistas são bastante variadas em forma, tamanho e nas características das informações. Consultei também os Estatutos da Cooperativa, comparando as mudanças de um para o outro. Tomei emprestadas algumas revistas Manchete e O Cruzeiro para compreender o período histórico.







            Com o trabalho de campo fui direcionando o caminho que deveria tomar. As fontes me chamaram a atenção para questionamentos que não conhecia. Descobri que na virada do século XXI, a Cooprata, para se modernizar havia implantado um sistema de coletar o leite em que os produtores deveriam adquirir um tanquinho (resfriador de leite). A granelização foi motivo de muitas discussões e até de afastamento de associados da Cooperativa. Nesta questão procurei dar voz aos pequenos produtores que são os mais prejudicados e os que mais perdem num confronto direto de forças, apesar de serem sempre maioria.

            Roberto Rodrigues professor de Cooperativismo da UNESP afirma que, vem uma associação, não se deve tratar com igualdade os grandes e os pequenos, porque senão os grandes podem “ir embora”. Procurei mostrar com esse trabalho que é o contrário que acontece. Sem os pequenos, quem os grandes produtores iriam explorar?

            A cada ano que passa observo que o cooperativismo e o capitalismo vão se tornando incompatíveis. A imposição constante de uma maior produtividade por parte do capitalismo vai destruindo as relações de mútua ajuda proposta pelo cooperativismo. Na prática, a palavra cooperativa vai perdendo seu significado.

            A monografia em três capítulos: A Cooperativa e sua importância para o município do Prata, a História da Cooprata, e Estratégias e resistências dos cooperados.

            No primeiro capítulo procurei discutir o que representa a Cooperativa para o associado, para o município e sua importância política para a cidade. Para alguns cooperados, a Cooperativa é uma conquista, muitos porém sentem as mudanças como perdas, ou seja, eles se sentem prejudicados com as reformas que a Cooperativa vem praticando.

            No segundo capítulo resgatei o sentido do cooperativismo nas falas dos associados. Interrogamos como é percebido a instituição com suas modificações estatutárias e os melhoramentos na sua estrutura física e como aconteceram as tentativas de conquistar um novo mercado consumidor.

            No terceiro capítulo pesquisei a relação cooperado/cooperativa. Como a Cooprata tem procurado orientar os seus associados para uma maior produção de leite? Indaguei porque a Cooperativa procura agradar os associados com festas e presentes e como a religiosidade dos associados é apropriada pelos dirigentes da Cooprata para “orientá-los” no sentido de serem “bons” associados. Estratégias são usadas para aumentar a produtividade dos cooperados.

            Para a realização desse trabalho com as entrevistas orais, que depois de gravadas foram transcritas, procurei orientação em autores especialistas em história oral. Alguns outros autores de diversas áreas também foram consultados.

 Como demonstra a bibliografia ao final desta monografia. As revistas informativas da Cooprata se consultadas não foram muitas, porque até então não tinha conseguido todas as que tenho agora. Tanto das entrevistas como dos informativos foram transcritos pequenos trechos no texto final, compondo a análise e mostrando ao leitor as narrativas elaboradas pelos depoentes.



                                    CAPÍTULO 1


 A COOPERATIVA E SUA IMPORTÂNCIA PARA


O MUNICÍPIO DO PRATA





“A verdadeira filosofia é reaprender a ver o mundo, e nesse sentido uma história narrada pode significar o mundo com tanta “profundidade” quanto um tratado de filosofia”.1






            A Cooperativa dos Produtores Rurais do Prata foi fundada por 22 fazendeiros, em 21 de fevereiro de 1965, ao comprarem um laticínio que lhes devia uma boa soma em dinheiro. O restante do pagamento foi retirado em empréstimo em um banco.

            Outros produtores foram se juntando a este grupo e, em cinco anos, em julho de 1970, a Cooperativa adquiria a usina de beneficiamento de leite, onde funciona até hoje, sendo a maior arrecadação de I.C.M.S (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) do município do Prata e uma das maiores cooperativas de leite do Brasil.

            A Cooprata está localizada em Prata, no centro do Triangulo Mineiro, a 70 km de Uberlândia. Hoje recebe o leite 100% granelizado, ou seja, não há mais recepção de leite em latões. Isso para os diretores da cooperativa é a maior modernização alcançada até hoje, a passagem da coleta em latões para o tanquinho, sistema de resfriamento do leite na própria fazenda. Assim nos diz o Gerente administrativo Valdenir Gouveia de Moura: “A maior modernização nossa foi o sistema de coleta de leite em que a gente tinha o sistema de coleta de latão e passou pro tanque. Num primeiro momento, muita gente achou que aquele negócio era ruim, que a Cooperativa estava penalizando o pequeno. (...)”2.




 
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1 Merleau-Ponty, Maurice. 1908-1961, Fenomenologia da percepção. São Paulo: Martins Fontes, 1994. (Coleção Tópicos), p.19
2 Entrevista: Valdenir Gouveia de Moura, 46 anos: Gerente Administrativo desde 1978, 25/10/03





            Segundo o diretor presidente (2000/2003) José Carlos Chaves Cunha: “a granelização é a modernidade que o mercado exige do setor leiteiro”3. Com a granelização, a cooperativa está mantendo um padrão de qualidade que os órgãos governamentais estão exigindo para 2007. Com a  granelização,  o  leite  recebido   que era de 120 mil litros, antes de 2000, passou para 160 mil litros de leite/dia, mesmo com a redução de sócios de 800 para 660. “Perdemos quase 200 produtores que não granelizaram ou mudaram de atividade e ainda aumentamos a produção em mais de 30%, acrescenta, João Batista de Queiroz, Diretor Comercial (2000/2003).4

            A Cooprata conta hoje com supermercado, loja veterinária, departamento de compras, laticínio e fábrica dos produtos Rádios: manteiga, queijo mussarela, queijo prato, queijo provolone, doce de leite em pasta, barra puro e com coco, queijo minas frescal, requeijão, ricota, leite tipo C e longa vida. Possui também uma oficina para consertos de máquinas, um escritório, departamento de insumo e fábrica de sal mineral  e ração. A Cooprata tem 10 comunidades rurais, onde são feitas reuniões mensais com palestras e orientações para tornar o associado mais participativo. A administração da Cooperativa faz das mudanças uma avaliação positiva, mostrando como a assistência ao produtor resultou em favorecimento mais regular do leite e em aumento da produção:

            O trabalho que a gente tem feito com o produtor, e esse é o melhor, o que mais aumentou a produção, para você ter uma ideia antes da granelização, do trabalho de alimentação a produção era muito irregular. Melhorou quando aqui no Prata começamos a utilizar a cana para tratar do gado. Nós tínhamos um problema até 1998, porque na época da safra a Cooperativa produzia aí, 120 mil litros de leite na época da entre-safra, essa produção caía pra 50, 60 mil litros de leite, um corte de 50% na produção. Numa época faltava leite em outra época sobrava leite. Mas com um trabalho de assistência técnica, de mostrar para o produtor que ele não podia ter um pique na produção. De lá para cá o produtor passou a produzir o leite dele na safra e na entre-safra. Os técnicos empregaram um sistema de conscientização do produtor, para empregar a cana na seca”.5





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3 Cooprata. Edição Especial, 2000, 2002; Uberlândia: Expediente, p.2
4 Cooprata. Edição Especial, 2000, 2002; Uberlândia: Expediente, p.2
5 Informativo Cooprata. Ano III, n.º 45, Nov./2001; Uberlândia: Expediente, p.2


 









            Para atender as necessidades imediatas de estocagem do leite, a Cooperativa instalou um novo silo com capacidade de 100 mil litros de leite, somando agora uma capacidade de estocagem de 290 mil litros. A Cooprata conta hoje com 10 caminhões tanque, com capacidade de transporte de 8 mil litros de leite, e 1 caminhão com capacidade de 12 mil litros. No mês de dezembro de 2003, a Cooprata secou 1 milhão e 800 mil litros de leite integral na Parmalat e na CCL (Cooperativa Central de Laticínios – Paulista) em Itumbiara-GO., onde está estocado todo produto. “A previsão de secagem do leite para janeiro deste ano é de 3 milhões e 800 mil litros de leite integral”.6

            Mas não são todos os produtores que aumentaram sua produção de leite. O Sr. Jair Lima Arantes, 53 anos casado, mora desde que nasceu no sítio de 14 hectares, a 15 km da cidade, e tira leite a mais de 20 anos para a Cooprata. Ele nos respondeu a esta pergunta: - Quantos litros de leite o Sr. tira? J.L – “Numa base de 50 litros, nem adianta tirar mais com um preço desses...”7. Realmente, o preço do leite bruto é pequeno, está entre 0,30 a 0,40 centavos, para o produtor; depois de industrializado, o leite é vendido a mais de R$ 1,00. O que o Sr. Jair quer dizer na sua fala é que a margem de lucro é muito pequena, portanto, no entender dele, aumentar a produção seria possível, mas é melhor produzir outra coisa. No momento da entrevista ele estava transportando lenha para uma pequena carvoeira que ele possui em suas terras.

            A Cooprata, a partir do dia 17 de dezembro de 2001, implantou um pagamento diferenciado para o preço do leite: até 300 litros/dia o preço não sofre variações, mas daí até 900 litros/dia o preço tem um acréscimo de R$ 0,0001 por litro de leite, limitado ao máximo de 900 litros. O Sr. Jair como tira 50 litros/dia recebe por volta de R$ 0,32, mas um produtor que tira perto de 900 litros recebe mais ou menos R$ 0,40 por litro de leite.



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6 Revista Cooprata, Ano VI, n.º 69, jan./2004; Uberlândia: Expediente, p.2
7 Entrevista: Jair Lima Arantes. 51 anos; pequeno sitiante, 63 anos, 09/02/04



 









            A Cooperativa mantém com o Banco do Brasil um convênio. No ano de 2001 houve investimentos no Custeio Pecuário: custeio da propriedade como reforma de pastagens ou de currais; manutenção do gado na propriedade - para vender o gado o produtor pode financiá-lo, 30 produtores o fizeram, num total de R$ 500.000,00. Com o Pró-posto (reforma e recuperação de pastagem) foram beneficiados 11 produtores, num total de R$ 289.000,00; qualquer produtor pode fazer esses financiamentos se existirem verbas disponíveis no banco e se seu projeto for aprovado. Tanto o Custeio Pecuário como o Pró-posto foram negociados com juros de 8,75% ao ano, em 2001, mas hoje o juro está 16,5% mais taxas, o que dá mais ou menos 17% ao ano. Também foram feitos financiamentos pelo Proger (Projetos de gerenciamentos), destinados ao pequeno produtor com renda anual de até R$ 80.000,00, com carência de um ano, juros de 7,25%, para ser pago em até cinco anos; 31 produtores fizeram esse financiamento em 2001, perfazendo R$ 546.000,00.

            E o Pronaf (Programa Nacional de Agricultura Familiar) para quem tem renda somente para a subsistência: cada agricultor pode financiar R$ 7.500,00, com carência de um ano e sete para pagar; 12 produtores fizeram esse financiamento em 2001, totalizando R$ 169.000,00. Além de financiar matrizes leiteiras, reformas de pasto, também podem ser adquiridas máquinas agrícolas novas ou usadas.8

            A Cooperativa possui também convênios com várias escolas, hospitais e com a UNIT (Centro Universitário do Triângulo) para assistir os cooperadores e seus funcionários.
A Cooprata presta serviços e assistência técnica, agronômica, veterinária, zootécnica e social aos produtores associados. As matérias publicadas no Informativo Cooprata demonstram a preocupação em mostrar o trabalho da diretoria de assistência ao cooperado, dentro das mais modernas tecnologias para o setor:









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8 Cooprata Edição Especial, 2000/2002. Uberlândia: Expediente, p. 15





            Está sendo desenvolvido ainda um estudo sobre água, solo e gramíneas, através de análises solicitadas à U.F.U (Universidade Federal de Uberlândia). Estas pesquisas já resultaram em novas fórmulas de sal mineralizado, que está sendo fabricado pela Cooperativa”.9



Mas outra fábrica de sal e ração, toda automatizada, com um custo aproximado de R$ 3 milhões, já está sendo construída no distrito industrial em um terreno cedido pela Prefeitura Municipal em 2004. Ainda não há previsão para o término da obra, porque faltam recursos. Mas, mesmo assim, a Cooprata continua investindo em profissionais que atuam nessa área. A preocupação com o rebanho e com a produção de leite tem caracterizado as ações da Cooperativa no decorrer dos anos e em consequência seus investimentos, como é o caso do proteinado para bezerro e ração para touro:

            Pensando na eficiência e profissionalismo dentro da indústria foi contratado um engenheiro agrônomo, Luciano Rezende para chefe do Departamento de insumos e para enfatizar o controle de qualidade foi contratado também Dr. Júlio César Teixeira, PHD em nutrição animal, que mensalmente analisa a matéria prima da ração, conferindo sua qualidade nutricional. No ano passado Dr. Júlio César estava trabalhando na reformulação do sal mineral e para isto foi analisado amostras de solo, capim, silagem e água de diversos pontos da região. Em resposta a essa análise o sal foi novamente formulado para oferecer ao produtor um produto de boa qualidade resultando em animais saudáveis. Com esta inovação a Cooprata lançou três novos proteinados, a Cooprata Cria e a Cooprata Bezerro (proteinado para bezerro mamando e bezerro desmamado) e também a ração para touro”. 10




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9 Revista Cooprata, marv/1992. Uberlândia: Joça Publicações, p.21
10 Cooprata  Edição Especial, 2000/2002; Uberlândia: Expediente, p. 19
11 Revista Cooprata,, mar/1992. Uberlândia: Joça Publicações, p. 22



 
            Quando o cooperado adquire o sal mineralizado, recebe também orientação de como oferecê-lo ao rebanho. O departamento, além de fabricar o sal e a ração, ainda fiscaliza o controle de vendas, dando prioridade ao mercado local. Mesmo assim se pode observar muitos caminhões carregados com sal ou ração com destino a outras cidades. “O médico veterinário da Cooprata, José Chaves de Souza disse que boa parte da produção é exportada para outros estados, como São Paulo e Goiás (...)”11. Sabemos que só o cooperado, ou alguém com sua autorização por escrito e em seu nome, pode comprar produtos da Cooperativa.

           








Mas nem todos os cooperados estão satisfeitos com o atendimento da Cooperativa. Exemplo disso é o depoimento do Sr. Jair Lima Arantes:

            “(...) Na Cooperativa o dinheiro do pequeno fica lá dentro mesmo. Do pequeno não dá retorno, dos rico não. Um caminhão de ração vai pra ele até com cinco ou seis pagamentos. E o pequeno não. O pequeno compra pra descontar no mês seguinte. Aí não tem como o coitado do pequeno fazer alguma coisa”.12



    O que o Sr. Jair está relatando é que para financiar a ração têm um limite de quantidade, ou seja, o fazendeiro que compra um caminhão pode financiar para vários meses, mas para o produtor que compra apenas cinco sacos, o valor é descontado na produção do leite no final do mês, e a produção de leite toda acaba por ficar nas despesas do sítio.

            A Cooprata oferece aos seus associados uma agência de auto atendimento, sendo um terminal e um caixa eletrônico do Banco do Brasil. As vantagens são tirar extratos, depósitos de produção de leite, limites de créditos, verificar o quanto vai receber pelo leite e o nível de uréia detectado no exame feito em seu leite.

            Esse exame é feito mensalmente na USP (Universidade de São Paulo) em Piracicaba-SP. Assim se pode saber se está correta a alimentação que o gado está recebendo. O informativo Cooprata explica na edição de outubro 2003:



            “Quando o teor de ureia está baixo, o animal diminui o consumo de alimentos significando queda na produção de leite e fazendo esta correção do teor de ureia do leite é essencial. (...) O nível de ureia no leite pode ser verificado no quiosque do escritório da Cooprata, com a ajuda da secretária Juliana”.13



            Aqui podemos perceber a distância tecnológica da Cooperativa e o pouco conhecimento de informática do produtor rural. É preciso que uma secretária fique à disposição, para fazer as consultas dos fazendeiros à máquina eletrônica.







 
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12 Entrevista: Sr. Jair Lima Arantes, 09/02/04
13 Informativo Cooprata , Ano V, n.º 66, out/2003. Uberlândia: Expediente, p. 1



            A Cooprata conta com supermercado e uma loja de produtos agropecuários para atender hoje não só cooperados, mas também a todo o município. O supermercado é bastante diversificado com: açougue, padaria, hortifrúti, lanchonete, confecções. É grande o seu movimento e suas vendas atingem um valor aproximado de 800.000,00 ao mês. Muitos cooperados respondem que fazem questão de serem produtores de leite para comprarem a crédito nas lojas da Cooprata.         


A Cooprata realiza em todo mês de julho, o concurso leiteiro. Pode participar qualquer fazendeiro filiado a Cooperativa, com apenas uma vaca, sempre da raça girolanda (meio sangue). O fazendeiro cujo animal der o maior volume de leite será o vencedor do concurso. O concurso dura três dias, durante os quais é feita uma média das duas ordenhas diárias, uma de manhã e outra à tarde. A Cooprata viabiliza o transporte das vacas das fazendas para o local do concurso, fornece ração, assistência veterinária e pessoal para tirar o leite.

  O Concurso Leiteiro é sempre realizado no início da Exposição Agroindustrial de Prata, no Parque Virgilio Galassi. (Possui esse nome em homenagem ao ex-prefeito de Uberlândia que doou a cobertura para os 4 barracões) com distribuição de prêmios e troféus aos vencedores, sendo que o último colocado recebe o troféu “balde furado”.
Em 1997, com a sugestão do Departamento Técnico da Cooperativa foi fundado um torneio leiteiro a nível de fazenda. A vantagem desse concurso é que não é preciso deslocar os animais da fazenda. Mas mudam as regras: neste o produtor participa com número de animais proporcional ao volume de sua produção. Cada associado participa no mínimo com duas vacas e cada 100 litros que envia para a Cooperativa dá direito a participar com mais uma vaca.
         Atualmente esse concurso está sendo realizado duas vezes ao ano, na época da seca, entre-safra, e nas águas, época da safra. Segundo a diretoria de 2000/2003, esses concursos têm sido importantes para orientar o pecuarista sobre a alimentação correta das vacas:




            A baixa produção de leite não acontece mais na época da seca, porque o produtor se profissionalizou e oferece uma alimentação correta. Agora, a queda na produção está ocorrendo nas águas, ou seja, fevereiro e março.
            Para orientar o pecuarista como alimentar corretamente os animais na época das águas, a Cooprata decidiu promover o Concurso das Águas. Dessa forma, o produtor consegue manter a produção leiteira em alta o ano todo, minimizando o problema da cota, consequentemente melhor remuneração ao pecuarista (...)” 14


            A Cooprata desde 1997 vem promovendo o Dia de Campo, segundo seus dirigentes, para despertar o interesse do cooperado para as novas tecnologias de produção, para levar informações e técnicas viáveis a um grande número de pessoas de uma só vez:

            “(...) Bem informado o associado não é excluído do mercado que está cada vez mais exigente, com isso a Cooprata vem realizando com sucesso os Dias de Campo. Uma nova ideia que veio e que agora é marca registrada da Cooperativa graças a sua eficiência em levar novos conhecimentos ao associado, há também o lado social onde o associado tem a oportunidade de rever amigos e trocar ideias e opiniões, até mesmo sobre os acontecimentos destes dias (...)” 15







            Na década de 90 a Cooprata vinha promovendo o Dia de Campo em outras regiões, principalmente no estado de São Paulo, em regiões de grandes produtores de leite. Ultimamente têm sido realizadas apenas no município do Prata. Segundo o diretor presidente (2000/2003), José Carlos C. Cunha : “Na minha opinião, levar grupos de produtores para visitar propriedades de outras regiões (...) fugia de nossa realidade”16


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14 Cooprata, Edição Especial, 2000/2002; Uberlândia: Expediente, p. 25
15 Idem, p. 22
16 Informativo Cooprata. Ano III, n.º 45, Nov/2001. Uberlândia: Expediente, p.2
17 Idem, p. 1




 

            O 4º Dia de Campo da região foi realizado no parque de exposições, no mês de novembro de 2001 e contou com a participação de 400 produtores, segundo a diretoria. No Informativo Cooprata podemos observar a opinião de diversos participante como a da Srª Eliza Francisca Q. Vieira: “Sempre participo dos dias de Campo. Este me ensinou muito, pois, ainda tenho muita dificuldade na criação de bezerros”17









            A Cooperativa dos Produtores Rurais do Prata é considerada uma das cinco primeiras cooperativas do Brasil e, como empresa, está entre as 2.000 maiores do país. 18
            Portanto é de se esperar uma preocupação política entre seus administradores. Muitos dos seus dirigentes já foram candidatos e até mesmo prefeito da cidade do Prata, como é o caso do presidente (1.986/1.989), Manoel Vilela Júnior, que foi também prefeito em 1977/1983. As disputas eleitorais são acirradas. Narcio Rodrigues da Silveira, hoje deputado federal, registrava na Revista Cooprata, editada naquela época por ele:
            “em 1986, fui informado de que Manuel iria disputar a presidência da Cooprata. No dia da eleição, estive em Prata, para cobrir o evento. A disputa era, de fato, acirrada. Manuel estava tranqüilo. Comentei com ele que havia quem apostasse na sua derrota. Ele riu, com o eterno cigarro no canto da boca. “Esta já está no papo”, assegurou antes do início das apurações. Dito e feito, Manuel teve uma vitória expressiva.”19

            Podemos observar também um discurso em que cada diretoria procura destacar seus feitos e diminuir o das outras gerencias. Como da diretoria 1989/1992, em que na mensagem final os diretores falam:
           

“(...) Estamos entregando, agora, nossos cargos. Temos consciência de que, ao passar a Cooperativa dos Produtores Rurais de Prata às mãos de nossos sucessores, deixamos cumprida a etapa a que nos dispusemos quando assumimos esta diretoria. A missão foi árdua, mas é bom perceber, hoje ao concluí-la, que estamos entregando uma cooperativa melhor e uma empresa melhor estruturada do que aquela que recebemos.(...)” 20



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18 Informativo Cooprata, Ano VI, n.º 69, Jan/2004; Uberlândia: Expediente, p. 02
19 Revista Cooprata, dez/1987, n.º 18. Uberlândia: Qualidad, p. 02
20 Revista Cooprata, mar/1992; Uberlândia: Joca Publicações, p. 02
21 Revista Cooprata, dez/ 99. Uberlândia: Expediente, p. 23




 

            Mais adiante o diretor comercial, José Roberto Teodoro Franco, respondendo a pergunta do redator: “Qual a principal característica da Cooprata?” Diz ele que: “Ao crescer, a Cooprata se organizou, mas poderia ser ainda melhor se cada diretoria que a assumisse desse continuidade no trabalho desenvolvido pela diretoria anterior”. 21












            Quase todas as diretorias costumam fazer comparações com a produção anterior, como a entrevista do diretor comercial (1996-2000) Amauri Resende Junqueira: “(...) O seu principal produto, com grande aceitação, sem dúvida é a manteiga. Quando assumimos a Cooperativa a produção era de 35 a 45 ton/mês, hoje está de 80 a 100 ton/mês.”

            Podemos observar em outra revista a fala da diretoria (1.986/1989), já citada, fazendo o balanço:



            “Quando a atual diretoria da Cooprata assumiu, em 1986, a capacidade de industrialização desta empresa era de apenas 20 mil litros por dia. Hoje, dois anos depois, a realidade é bem outra. Os investimentos feitos na ampliação da indústria dão à entidade condições para industrializar nada menos que 240 mil litros de leite por dia.(...)” 22



            Na mesma revista, o presidente Manuel Vilela Júnior comenta em entrevista os mexericos políticos, ao responder a pergunta feita pelo repórter da revista: “Há poucos dias correu um boato de que a Cooprata estava enfrentando uma série crise financeira. Como o Sr. vê isso? O presidente: “Estes boatos são, como o próprio nome diz, boatos. Muita gente gostaria que a cooperativa não desse certo só para tirar proveito político disto. (...)”

            A partir de 2002 o estatuto da Cooprata foi modificado. Ela é administrada por um Conselho constituído de 09 (nove) membros, sendo um Presidente, um Diretor  e 07 (sete) conselheiros efetivos, para um mandato de 04 (quatro) anos. O candidato deve escolher se quer ser eleito para presidente ou diretor. O mais votado para presidente será empossado, Presidente, o mesmo acontece com o Diretor. Os outros 7 mais votados completarão o Conselho administrativo.





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22 Revista Cooprata, 1986. Uberlândia: Qualidad, p. 26









O Presidente e o Diretor recebem honorários, os demais membros do conselho recebem cédulas de presença em valor anualmente fixado pela Assembleia Ordinária. O diretor hoje, Carlos Henrique Pádua Alves, explicava antes da mudança, que esta foi importante: “é porque anteriormente demorava um tempo para a nova diretoria se inteirar dos assuntos, prejudicando as decisões administrativas, (...)”23. Até 2002, o poder era da diretoria executiva (Diretor Presidente, Diretor Produção e Diretor Comercial) e agora é administrada pelo Conselho Administrativo juntamente com um administrador de empresas contratado no mercado de trabalho, que deverá propor ao Conselho de Administração diretrizes, metas, normas e planos de ação (A diretoria empossada em março de 2003 ainda não conseguiu contratar esse profissional).

            Segundo José Carlos, presidente 2000/2003, era preciso o acompanhamento de uma consultoria para orientar os diretores a: “tocar metas com planejamento e se necessário direcionar novos rumos à empresa, ficando esclarecido que todas as decisões tomadas será com aprovação da diretoria e conselhos administrativo e fiscal”.

            Para termos uma ideia da importância da cooperativa para o Prata ouçamos o seu gerente administrativo, Valdenir Gouveia de Moura: “Desde quando eu entrei a Cooprata é o alicerce da cidade, maior arrecadação de I.C.M.S do município, então quer dizer, renda para todo município. A cidade gira em volta da Cooprata.” 24 Nesta fala, a Cooprata aparece como um sujeito em si mesmo, dando-nos a impressão que todos os cooperados vêm a Cooperativa e participam dela da mesma forma. As referências que o Sr. Jair Lima Arantes faz aos pequenos, no entanto, nos levam a perceber a Cooperativa como um lugar onde as tensões do social são vividas.

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23 Cooprata Edição Especial, 2000/2002. Uberlândia: Expediente
24 Entrevista: Valdenir Gouveia de Moura, 25/10/03



 













                       CAPÍTULO 2

               A HISTÓRIA DA COOPRATA




A comunidade de bens entre os primeiros cristãos. Ananias e Safira.


“32. E  era um o coração e a alma da multidão dos que criam, e ninguém dizia que coisa alguma do que possuía era sua própria, mas todas as coisas lhes eram comuns”. 25








            Como vimos no capítulo anterior, a Cooperativa dos produtores do Prata foi fundada por 22 produtores que compraram um laticínio de leite. Mas com as transformações históricas daquela primeira sociedade em um próspero empreendimento industrial, encontramos a pergunta de um dos seus fundadores, Sr. Pedro Queiroz Assunção, 83 anos, aos diretores (gestão 1996/2.000) da empresa: “porque vocês não põem uma placa com o nome de quem fundou essa cooperativa? Ninguém fez nada, né?... Isso já nasceu assim?...”26

            As instituições capitalistas parecem ter uma preocupação em distanciar cada vez mais o produtor, o associado, o cooperado, o homem simples, das suas criações através de uma apresentação muitas vezes pomposa. O que acaba por constranger, ou intimidar a participação dos seus associados. No prédio da Cooprata funciona uma agência bancária, a Credi-cooprata que é uma cooperativa financeira. A suntuosidade do seu interior constrange as pessoas mais simples e acaba sendo um divisor social. São artifícios racionais utilizado pelo capitalismo para disciplinar, classificar e organizar as pessoas. Assim observa Fenelon:

Ao erigir a razão como elemento definidor da organização social e transformá-la em instrumento de poder, o capitalismo acabou por domesticar os homens e suas consciências, conduzindo a inúmeras formas de disciplinarização e de tirania política, visíveis nas instituições, mas também presentes no dia-a-dia, nos valores, nos hábitos e outras formas de governo das pessoas”. 27



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25 Atos dos Apóstolos; 4:32, In: Bíblia Sagrada, Rio de Janeiro: Gráfica Editora Primor Ltda, 1988; p.158
26 Entrevista: Pedro Queiroz Assunção, 83 anos, Fazendeiro Fundador da Cooprata,  17/10/03
27 FENELON, Déa. O historiador e a cultura popular: história de classe ou história do povo. In: História & Perspectivas. Uberlândia: EDUFU, n.º 6, 1992, p. 05
 
           








Mas o pedido do Sr. Pedro Assunção, depois de ser registrado em ata, acabou por ser atendido na diretoria de Durval Vieira Alves, em 1999. Uma placa foi descerrada com o nome dos 22 primeiros sócios. Na revista Cooprata, 34 anos, encontramos justificativas  honrando o ideal do cooperativismo:




“(...) Graças a união dos fundadores e a soma de esforços de cada associado é que a Cooprata conseguiu chegar ao que é hoje: uma empresa vitoriosa no campo da produção, uma cooperativa que na busca constante da excelência empresarial tem conquistado cada vez mais a confiança das empresas e das pessoas. O principal objetivo das administrações é o de atender cada vez melhor, satisfazendo todas as expectativas e necessidades dos cooperados, pois assim se tem a certeza de estar perpetuando um dos melhores sistemas do mundo: o Cooperativismo onde o sucesso depende de um esforço conjunto.
            A atual Diretoria, Durval Vieira Alves, Amauri Resende Junqueira, Neirton Alves da Silva quis deixar gravada numa placa e numa galeria de ex-presidentes, que na realidade é uma galeria de ex-administradores, um pedaço da história da Cooprata para que as gerações futuras tomem conhecimento dela e principalmente com a preocupação de que sua história não se perca no tempo, como muitas vezes acontece.
            Muitos dos fundadores já não se encontram mais entre nós, mas o nosso reconhecimento ficará para sempre gravado nesta pequena homenagem que prestamos a todos eles.28





            A Cooprata surgiu, segundo o Sr. Pedro Assução, de uma usina que comprava o leite no Prata, que não estava conseguindo cumprir os seus compromissos financeiros com os fazendeiros. Numa reunião alguns destes produtores resolveram: “vamos comprar esse “trem”, vamos formar uma cooperativa!” 29


           




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28 Revista Cooprata, Uberlândia: Expediente. dez/99, p.04
29  Entrevista:  Sr. Pedro Queiroz Assunção; 83 anos, 17/10

        A Cooperativa dos Produtores de Leite do Prata começou então dessa transação entre o usineiro endividado e os credores do laticínio. O processo da negociação foi complexo e demorado. O usineiro Dirceu Arantes marcava data para o negócio, mas não aparecia. Para o Sr. Pedro: “um paulista, safado, malandro”. Mas, por fim o acordo foi realizado no dia 21 de fevereiro, de 1965. O capital devedor foi descontado e o restante os fazendeiros tiraram em empréstimo em um banco. O Banco também prestou assistência aos novos cooperados através de um orientador cooperativista: “Moacir Lobato era o chefe que dizia: vocês fazem assim,..” . O senhor Pedro continua:


“Num dia a Cooprata já passou a ser nossa, no outro dia o leite já chegou tudo por nossa conta. Marcamos uma reunião com os fornecedores e com os choferes que estavam sem receber. Ali já foi escalado para os 22, cada um na sua região captar companheiros. Vamos formar a cooperativa, tem que ajudar né? Aí surgiu os comentários na cidade: ‘isso já nasceu morto’. Isso sai mesmo, né? Uns diziam que íamos puxar leite na ‘cacunda’, há, há. Fui no Odálio, tive conversando com ele lá, explicando pra ele. Aí a Tosta (mãe) disse: ‘não vamos entrar nisso não, espera!’ Ele falou: ‘não o Pedro tá lá dentro, o Pedro tá lá junto.’ Ele tinha confiança, né?”30



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30 Idem; p03,04


 




  



























Podemos perceber na fala do Sr. Pedro Assunção como as primeiras dificuldades se transformaram em determinações, motivos para o empreendimento da tarefa proposta pelo grupo, a de arrebanhar produtores, e despertar a conscientização cooperativista: “tem que ajudar né?”. Também podemos perceber como as relações de convivência são determinantes na ampliação do grupo de associados, o conhecimento da índole do companheiro traz confiança à formação do novo grupo: “(...) o Pedro tá lá dentro, o Pedro tá lá junto”. Assim outros produtores foram se juntando ao grupo e em cinco anos, em julho de 1970, a Cooperativa adquiria as instalações de sua concorrente: a usina de beneficiamento de leite da firma Pádua e Cia., onde a Cooprata funciona até hoje.
        Cooperativa é uma associação de pessoas que reciprocamente se obrigam a contribuir com bens ou serviços para a exploração de uma atividade econômica, de interesse comum, sem objetivo de lucro (Art. 1º “(...) é uma sociedade civil cooperativista sem fins lucrativos, (...)”31. O cooperado é a pessoa que se associa a uma cooperativa e dela participa ativamente, cumprindo os seus deveres  exigindo os seus direitos. O produtor se diferencia um do outro pela idiossincrasia, mas, o produtor rural, principalmente o pequeno produtor, além da quantidade e qualidade produtiva, se destaca pela cultura, pelas características regionais. A Cooprata é um exemplo de associação em sistema capitalista de produção, o que coloca nas suas finalidades a perspectiva de aumento do capital investido, tanto para investimentos, como para usufruto dos associados. Nesse sentido, ela também é uma empresa que visa lucro.

THOMPSON nos ajuda a refletir sobre as contradições inerentes ao capitalismo quando afirma que a lógica história é de um tipo diferente de lógica, deve ser uma lógica adequada aos fenômenos que estão em movimento:

“Assim como o objeto de investigação se modifica, também se modificam as questões adequadas. Como comentou Sartre: ‘A história não é ordem. É desordem: uma desordem nacional. No momento mesmo em que mantém a ordem, isto é, a estrutura, a história já está a caminho de desfaze-la”.32



            Nesta perspectiva, o trabalho do historiador não pode se resumir a descrições auto confirmadoras de processos evolutivos globais. O nosso objeto de reflexão é o comportamento humano, as formas diferenciadas como as pessoas atribuem sentidos às suas vivências.




 
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31  Estatuto da Cooperativa dos Produtores Rurais do Prata Ltda. 29 nov/2002, p.4.
32:THOMPSON, E.P. A Miséria da Teoria ou um Planetário de Erros. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1998, p.48.



            Para podermos entender o que representa a Cooprata para o pequeno produtor rural, fizemos entrevistas com dois produtores que residem cerca de apenas 5 km um do outro, inclusive fomos incentivados pelo primeiro para que entrevistássemos o outro. O primeiro, Sr. João “Amâncio”, 66 anos, nos respondeu da seguinte maneira às perguntas: - Quando o Sr. se tornou cooperado? “- Faz 22 anos, mas faz dois anos que eu deixei de ser cooperado. Eu saí porque as coisas foi modificando cada dia mais. Tinha que comprar esse tanquinho, né? A gente não tem condição a Cooperativa não dá condição. Só dá condições pro rico, pro pobre não dá.” – Mas a Cooperativa não financia? “- Financia, mais ocê não tem como pagar, né? O pequeno não tem como pagar, fica caro demais”.33

            Já o Sr. Jair Lima, 53 anos perguntado pelo tanquinho respondeu. “- Comprei.” – O tanquinho foi caro? “- Não, é a mesma coisa de pagar a prestação de um latão ... Não é caro, mais é barato pagar. O meu custou R$ 5.700,00. A prestação é de R$ 79,00 (R$ 79,00 por mês). “Quer dizer que é maneiro demais... É descontado no leite... 34.

            O gratificante da historia oral é relacionar-se com pessoas, ela “(...) pode devolver às pessoas que fizeram e vivenciaram a história um lugar fundamental, mediante suas próprias palavras”. 35. O mérito, segundo Paul THOMPSON; é o de levar os historiadores a tomarem consciência de que sua atividade se exerce, inevitavelmente, dentro de um contexto social e que tem implicações políticas: “A realidade é complexa e multifacetada; e um mérito principal da história oral é que, em muito maior amplitude do que a maioria das fontes, permite que se recrie a multiplicidade de pontos de vista”36. E as palavras podem ser emitidas de maneira idiossincrática, mas, por isso mesmo, são mais expressivas. Elas insuflam vida na história.





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33:Entrevista: Sr. João Camilo de Souza, 66 anos, casado, em 09/02/04
34:Entrevista: Sr. Jair Lima Arantes, 63 anos, casado, em 09/02/04.
35:THOMPSON, Paul, A voz do passado: História oral; tradução: Lólio Lourenço de Oliveira, Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1992, p. 22
36:Idem; p. 25


            A história oral, tem permitido abordar a história como um processo construído pelos próprios homens, portanto múltiplo e ambíguo, apreendendo no social leituras diferenciadas sobre os práticas cotidianas dos diversos sujeitos:

“(...) torna possível um julgamento muito mais imparcial: as testemunhas podem, agora, ser convocadas também de entre as classes subalternas, os desprivilegiados e os derrotados. Isso propicia uma reconstrução realista e mais imparcial do passado, uma contestação ao relato tido como verdadeiro. Ao fazê-lo, a história oral tem um compromisso radical em favor da mensagem social da história como um todo.”37



            Em trabalho de campo, os historiadores veem-se longe de sua mesa de trabalho, compartilhando de experiências com outras pessoas. Como disse Michelet: “Minha investigação entre documentos vivos, ensinou-me muita coisa que não se encontra em nossas estatísticas (...)”38. “O método de Heródoto, no século V a.C, era procurar testemunhas oculares e interrogá-las rigorosa e minuciosamente”.39 Essas afirmativas nos fazem refletir sobre os significados diferenciados que as pessoas dão às suas vivências.

            No caso relatado – o tanquinho – as opiniões diferem de acordo com o lugar social ocupado pelo entrevistado e da sua relação pessoal com a Cooperativa.

            O Sr. Pedro Assunção nos contou que as dificuldades foram sendo superadas, no início, principalmente pelo empenho direto dos associados. Os diretores tiravam dinheiro emprestado no banco em seus próprios nomes para honrar os compromissos da Cooperativa. Ele próprio teria emprestado seu nome para essas transações. O diretor comercial da época, gestão 1965/68, Sr. Manuel Joaquim Andrade Júnior (Barãozinho), chegou a dirigir o caminhão de leite para Ibiá, São Paulo, por não poder contratar um motorista naquele momento que pudesse transportar o leite.40




 
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37 Idem; p. 26
38 Idem; p. 72
39 Idem; p. 52
40 Entrevista: Sr Pedro Queiroz Assunção, em 17/10/03



            Com a ajuda dos associados, que no final de cada ano passavam os lucros para a Cooperativa, conseguiu-se adquirir uma usina de beneficiamento de leite e uma fábrica de manteiga. Esses relatos dos primeiros anos da Cooperativa são carregados de emoção, como a nos dizer que naquele momento os sentimentos de solidariedade e ajuda mútua uniram os cooperados, sentimentos que foram se alterando com o passar do tempo.

            Todo ano é feita a prestação de contas pela diretoria em exercício, e o sistema de votação é sempre o mesmo: o cooperado em assembleia que não concordar com a aplicação do capital excedente nas melhorias do laticínio deve se levantar e permanecer de pé no auditório, ou seja, se ele permanecer sentado é porque concorda com a aprovação do lucro ficar na Cooprata. Muitos que não concordam, acabam por não se levantar por timidez.

            Na revista Cooprata de março de 1992 o diretor comercial daquela gestão, José Roberto Teodoro Franco, respondendo às perguntas do repórter do Joca Publicações L.t.d.a, direção do deputado federal Nárcio Rodrigues da Silveira, nos fala do capital excedente:  “-Como são tomadas as decisões em torno do capital excedente da empresa?”41. José Roberto:


“A Cooperativa necessita de um certo capital para o movimento diário. O lucro é aplicado no mercado financeiro e depois, em assembleia, os cooperados decidem o que fazer com ele. Na maioria das vezes opta-se pela aplicação em melhorias da cooperativa, garantindo a solidez do patrimônio, que passa a ter capacidade cada vez maior de produzir, e consequentemente, aumenta o lucro, e assim foi feito. As assembleias são sempre realizadas no final do mês de março, quando a diretoria presta contas do exercício anterior, tem aprovação ou desaprovação dos participantes e apresenta ainda propostas de melhorias”.42



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41 Revista Cooprata, mar/92. Uberlândia: Joca Publicações , p. 18
42 Idem


        Se observarmos o período histórico, vamos constatar que a Cooprata nasceu, em 1965, logo depois do golpe militar de 64 e cresceu juntamente com o chamado “milagre econômico brasileiro”. Sabemos que muitas lideranças rurais se engajaram nas corporações reacionárias daquela época e, segundo Barsanufo BORGES, essa participação “colabora com o golpe militar de 1964 e foi diretamente inspirado na intenção de alterar a composição política do Estado, de modo a influenciar nas suas diretrizes econômicas”43. Em artigo da revista O Cruzeiro, de 10/04/1969, fazendo uma análise dos resultados dos 5 anos de vigência do governo militar, Rau Giudicelli, escreve:

“(...) A agricultura e a saúde, dois pontos nevrálgicos em nosso país, tem recebido do governo, uma tentativa de racionalizá-los. Para a primeira – uma política desmitificada, uma política metodizada e permanente, de apoio às inciativas do campo (...)”.44



            Segundo Boris Fausto, a política de Delfim Neto, Ministro da Fazenda, se destinava a promover o que se chamava de desenvolvimento capitalista associado: “Muitos setores da grande indústria, dos serviços e da agricultura que gritam contra os gastos e a intromissão do Estado na economia beneficiaram-se largamente da ação do Estado naqueles anos”45. A política econômica de Delfim tinha o propósito de fazer crescer o bolo para só depois pensar em distribuí-lo. Alegava-se que antes do crescimento pouco ou nada havia para distribuir. Privilegiou-se assim a acumulação de capitais através das facilidades da concessão de créditos, isenções de tributos etc.

            A Cooperativa dos Produtores Rurais do Prata encontrou portanto um momento propício para se firmar e desenvolver. Apesar dos primeiros associados estarem a muito sem receber do laticínio, assumiram uma dívida para comprá-lo e fizeram outros empréstimos para melhorar as condições de funcionamento da empresa. Ainda no período militar adquiriram a fábrica de manteiga RÁDIO.






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43 BORGES, Barsanufo Gomides. A pecuária no Brasil Central e as organizações dos produtores rurais no Estado Novo. História e Perspectivas. Uberlândia, MG: Universidade Federal deUberlândia/EDUFU,  nº 25 e 26, jul/dez. 2001, jan/jun. 2002, p.260
44:Revista: O Cruzeiro, Rio de Janeiro, 10/04/1969, p. 83
43:FAUSTO, Boris. História do Brasil. 10 ed., S. Paulo: Editora da Universidade de S. Paulo, 1994, p. 486







            No capítulo anterior destacamos as disputas políticas entre os grupos diretores, onde havia sempre o enaltecimento das próprias obras em detrimento das obras realizadas pelas outras diretorias, mas o discurso muda de acordo com as necessidades do momento. Na revista publicada em 1997 evidencia-se um chamamento pelas vivências históricas da Cooperativa:

            “Nesses trinta e dois anos de atividade, a Cooprata passou por uma série de altos e baixos. Sofreu crises, que geraram chamadas de capital, recebeu super safras, investiu muito em seu patrimônio e melhoramento operacional, reconheceu os erros, deu a volta por cima, e principalmente, acertou muito. Acertou tanto que consolidou-se ao longo de todos esses anos, garantindo a produção e a comercialização do leite.
É uma história de luta, união de forças, confiança e muita competência. No imputo de resolver problemas, cada diretoria avançou, a passos largos, numa estrada, que por muitas vezes esteve cheia de espinhos e tempestade superadas graças ao esforço de cada um, que trabalha direta ou indiretamente para o sucesso da instituição. Uma história que começou com um grupo de produtores (...), que serão sempre lembrados com honra por todos que passaram pela Cooprata. Pessoas que merecem todas as homenagens, pela garra de abrir caminho para um futuro promissor. Pessoas que, por mais confiantes que fossem, provavelmente não sabiam do potencial de seu trabalho.
            Não imaginariam que a criação de uma cooperativa de leite, no Prata, se transformaria numa empresa sólida e organizada, capaz de se tornar a primeira colocada na arrecadação de ICMS no município.
            A expectativa hoje da população pratense é de que o setor produtivo projete cada vez mais o município, em todo país, oferecendo lá fora produtos de boa qualidade. O crescimento econômico da cidade depende em muito do apoio dos produtores rurais, que através da Cooprata, representam hoje a maior fonte de renda do município.”44



            A história da Cooperativa é resgatada para ser unificadora e incentivadora de ideias “capitalista-cooperativistas”. Todos os associados (presentes e passados) são colocados lado a lado num mesmo espaço, como se também formassem o mesmo todo harmônico e produtivo.
        Para os diretores da Cooprata, a placa comemorativa com o nome dos fundadores é um monumento. Mas e para o Sr. Pedro Assunção, um dos fundadores?


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44 Revista Cooprata, Ano 1, n.º 1, ago/97. Uberlândia: Expediente, p.







“Quando eles foram fazer a placa, eu perguntei: como vai ficar os nomes?...
E eles me falaram, por ordem alfabética. Aí eu falei: Nossa Senhora!, Se ainda não tiver pronta, pode parar com isso. Tem que ser por ordem de mérito e não por ordem alfabética, quem iniciou. Mas não tinha ficado pronta e aí mandaram mudar”. 45




        Para o Sr. Pedro é importante que se registre a história como ela foi vivenciada por ele. Não quer ser um dos primeiros, pelo contrário, quer que os nomes dos que mais participaram da construção da Cooperativa estejam adiante do seu.

            Para CALDAS, o oralista não aplica o método, ele o cria na dialogicidade viva entre a reflexão e a realidade, entre as falas e os silêncios, entre as imagens, os sonhos e os desejos. “A mutabilidade interpretativa da História Oral dá-se pela modificação do presente que interpreta (o passado como dimensão viva do e no presente), pela essência social de todo tipo de dados, pelas perspectivas de classe, sem expressão viva de uma perspectiva de valores.”46 Os diferentes aspectos valorizados pelos depoentes mostram-nos como as vivências estão embasando as lembranças na construção das histórias sobre a Cooperativa.

            O cooperativismo nasceu da necessidade de pessoas que praticavam uma mesma atividade econômica de cooperar uns com os outros para no final obterem um resultado maior no conjunto e que, dividido entre os associados, reverteria em lucro para todos. Encontramos na revista da Cooprata a história da primeira cooperativa:

“Em meados do século XVIII surgiu a chamada Revolução Industrial. A mão de obra perdeu grande poder de troca. Os baixos salários e a longa jornada de trabalho trouxeram muitos dificuldades socioeconômicas para a população. Diante desta crise surgiram, entre as classes operárias, lideranças com vontade de criar associações de caráter assistencial. Esta experiência não teve resultado positivo. Com bases em experiências anteriores buscaram novas formas e concluíram que, através de organização formal, chamada Cooperativa, com a participação de todos, as dificuldades poderiam ser superadas desde que fossem respeitados os valores do ser humano e praticadas regras, normas e princípios. Reuniram-se 28 pessoas, a maioria tecelões.Conciliaram, analisaram e avaliaram as ideias. Respeitaram os costumes e tradições e estabeleceram normas e metas para organização de uma cooperativa. Após um ano de luta acumularam um capital de 28 libras e conseguiram abrir as portas de um pequeno armazém cooperativo em Rochdale (Inglaterra), em 24/12/1844, com o nome “Rochdale Society of Equitable Pioners”. E assim foi criada a primeira cooperativa de consumo, com base nos princípios cooperativos.47













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45 Entrevista, Sr. Pedro Queiroz Assunção, 17/10/03
46 CALDAS, Alberto Luiz. Oralidade: texto e história para ler a História Oral. São Paulo: Edições Loyola, 1999, p7




            Nesse relato destacam-se alguns princípios que deveriam nortear uma associação cooperativa: participação de todos, respeito aos valores, costumes e tradição, obediência às normas estabelecidas. Em relações capitalistas de produção, como esses princípios são atendidos, considerando a diversidade de interesses dos associados?

Podemos observar pela sequência das reformas estatutais da Cooperativa dos Produtores Rurais do Prata Ltda, alterações que parecem abranger de uma forma mais completa o que deve ser entendido como cooperativismo. Nos primeiros estatutos como o ano de 1977, assim reza o 2º artigo do capítulo II, dos objetivos sociais: “A sociedade tem por objetivo a defesa econômico-social dos associados, mediante a prestação de serviços, representada na comercialização de seus produtos, no fornecimento de artigos e insumos e na assistência técnica.” 48 Já na reforma do estatuto de 1983, é acrescentado a este artigo o seguinte:

“(...) estabelecendo uma relação direta entre a produção e o consumo, para o que, observando rigorosa neutralidade política, e indiscriminação religiosa, racial e social, observará o seguinte programa de ação, realizados em seções distintas de acordo com as necessidades econômicas e possibilidades financeiras, e à critério da Assembleia Geral (...)”49









No último estatuto, o de 2002 não há alteração, neste artigo, em relação ao estatuto de 1999, que determina assim: “Art. 5º A sociedade, unindo os produtores agropecuarístas estabelecidos na sua área de ação, tem por objetivo promover a defesa comum dos interesses sociais e econômicos de seus cooperados, por meio da ajuda mútua a que todos se obrigam (...)”50



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47 Informativo Cooprata, Ano IV, n.º 52, jun/2002; Uberlândia: Expediente, p.07
48 Estatuto da Cooperativa dos Produtores Rurais do Prata Ltda, 1977, p. 07
49 Estatuto da Cooperativa dos Produtores Rurais do Prata Ltda, 1983, p. 06
50 Estatuto da Cooperativa dos Produtores Rurais do Prata Ltda, Cooprata 1999, p. 07 (o grifo é nosso)





No Estatuto, o princípio geral da ajuda mútua é ressaltado, reafirmando a  relação entre cooperativismo e participação de todos. No entanto, as políticas adotadas pelas diversas diretorias caminham em sentido contrário, fazendo emergir as contradições e as diferenciações sociais.
Nos últimos anos a principal discussão tem sido como as cooperativas podem ser mais competitivas sem que o cooperado perca, principalmente o pequeno, que é quem tem reclamado da globalização. Ouçamos o que nos diz Roberto Rodrigues, professor de Cooperativismo e Associativismo da Unesp/ Jaboticabal. S.P.:



“(...) o que tem de ser mudado é a relação comercial entre cooperado e cooperativa. Um cooperado que produz 1.000 litros de leite não pode ter o mesmo tratamento comercial que tem um cooperado que produz 50 litros de leite. É preciso criar um mecanismo intermediário, não numa relação direta entre 1.000 e 50, mas numa relação em que o maior tenha vantagens comerciais, como pagamento diferenciado, por qualidade e volume do leite etc., se não ele vai embora mesmo. Porque se igualar a todos, a cooperativa só com os pequenos não vai sobreviver.(...)”51



            Segundo esse professor, o cooperativismo é uma doutrina que visa corrigir o social através do econômico, mas se a cooperativa continuar tratando os “maus” cooperados com os mesmos privilégios dos “bons”, não se estaria cumprindo a doutrina. Parece que o bom é quem produz 1.000 litros de leite: “Não se pode tratar igualmente um bom cooperado e um mal cooperado.” Para ele é preciso uma profunda reformulação do comportamento das cooperativas frente a seu corpo funcional e associativo. Ele continua:

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51 Revista Cooprata. Ano 1, n.º 03, nov/97. Uberlândia: Expediente, p. 07. Entrevista: Roberto Rodrigues, 55 anos, agricultor e professor da Unesp.





             As cooperativas precisam cuidar da reconversão, que com a globalização da economia, especificamente com o Mercosul, é uma necessidade hoje. Tem de se buscarem atividades que garantam a permanência do cooperado no seu ramo e se ele está envolvido numa atividade profissional de produção ou de serviços em que não tenha competividade com concorrentes de outros países e que não haja no curto prazo condição de reverter esse quadro, é preciso mudar de atividade. Outro ponto relevante é a globalização da economia, que está gerando a segunda onda de desemprego (a primeira foi com a revolução industrial, que deu origem às cooperativas como uma resposta àquela situação), e mais uma vez as cooperativas têm de assumir um papel muito importante nesse processo, juntando essa massa enorme de desvalidos, em cooperativas de trabalho, de serviços, sob a visão de serviços, sob a visão da terceirização, no sentido de montar um novo projeto de cooperativismo.”52



            A partir de 1997 observamos preocupações a respeito de novos modelos e gerenciamentos para as cooperativas se tornarem mais competitivas e eficientes. Na revista de agosto/99 deparamos com a seguinte manchete: “Cooperativas buscam o caminho da modernidade”. Segundo o artigo era preciso uma reformulação do organograma:

            “Recentemente, o jornal “Diário do Comércio”, de Belo Horizonte, publicou uma matéria, assinada pela repórter Leidélia Villefort, sobre o caminho da modernidade das cooperativas. Segundo a matéria, as cooperativas estão despertando para a competividade e para um novo modelo de gerenciamento: “o primeiro passo para uma cooperativa sair de um estágio de declínio, deixando o passado para trás para ser inserida na modernidade e no contexto da globalização econômica, é a sua reestruturação organizacional”.53



            A nova cooperativa deveria ser sintonizada principalmente com a questão da produtividade e racionalização de custos. Portanto deveria apresentar resultados, ser lucrativa, vender bem para comprar bem e trabalhar com custos limitados. Resumindo: a base de gestão deve direcionar para a produtividade, competitividade e racionalização de custos.



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52 Idem, p.07


53 Informativo Cooprata. Ano II, n.º 18, Ago/99. Uberlândia: Expediente, p.06








  A diretoria 2.000/2.003 fez várias mudanças no sistema organizacional da Cooprata, inclusive mudando no estatuto a composição e a competência do Conselho de Administração. Ao invés de três diretores previstos no Estatuto anterior, escolhidos por chapas, agora se escolhem os mais votados. A Cooperativa é administrada por um Conselho de sete membros,  além de um presidente, um diretor e um gerente geral profissional contratado no mercado.

            Outras medidas foram tomadas, como salientou o diretor de produção em 2002, sócio fundador, Barãozinho. Medidas antipáticas:

            “A primeira medida “antipática” que a nossa diretoria adotou foi a Política de preço do leite, que hoje paga preço diferenciado pelo volume e qualidade. (...) Outra medida antipática implantada foi o Tanque de expansão. Hoje, a Cooprata está 100% gravelizada e tem mercado garantido, devido à qualidade do leite.(...)”54



            Parece que as medidas tomadas para readequar a Cooprata à modernidade recai sempre sobre os ombros dos pequenos produtores. A aquisição do tanquinho fica entre 5 a 6 mil reais, mas muitos pequenos produtores não têm nem a energia elétrica para ligar o tanquinho. Como diz o professor Roberto Rodrigues: “não se pode tratar igualmente um bom cooperado e um mal cooperado.”

            O número de associados da Cooprata sempre girou em torno de 1.000 associados ativos, ou seja produzindo leite para a Cooperativa: 1984 – 1053 sócios, 1985 – 1.004 s., 1986 –1.072 s., 1987 – 1.167 s., 1999 –1.049 s.

            A partir de 2.000, apesar do número de sócios continuar mais ou menos o mesmo, a quantidade de membros inativos aumentou em grande proporção: 2000 – 1.095 s/ 915 ativos; 2001 – 1019 s/ 827 ativos; 2002 –1.009 s/ 661 ativos; 2003 –1.050 s/ 740 ativos, ou seja, 310 inativos.
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54 Revista Cooprata. Edição Especial 2000/2002, p. 05. Uberlândia: Expediente. Entrevista: Manuel Joaquim Andrade Júnior (Barãozinho),



Por outro lado, a produção de leite dos associados tem aumentado. Segundo a diretoria é devido a uma melhor seleção dos animais produtores e de uma melhor alimentação para as vacas leiteiras. A média diária dos produtores em 2.000 – 125 l, 2001 – 153 l, 2002 –180 l, 2003 –181 l. Um grande aumento na média diária, mas não constatamos se houve um aumento do rebanho leiteiro.

            A Cooprata parece estar adotando as medidas necessárias para o novo quadro econômico mundial da globalização. As medidas “antipáticas” têm afastado principalmente os pequenos produtores do seu quadro. Tanto é assim, que a diretoria têm anunciado que apesar de muitos terem deixado de fornecer leite a produção têm aumentado. Isso quer dizer, os que saíram ou se tornaram inativos produziam pouco leite e teriam dificuldades econômicas para atender as novas exigências do laticínio.

            A partir de 1986, com a diretoria de Manoel Vilela Júnior, a Cooprata passou a dar prioridade à industrialização do leite: “Atingimos a surpreendente marca de 240 mil litros/dia em nossa capacidade de industrialização. E isto representou, numericamente, um crescimento da ordem de mil por cento (ou mais) na estrutura de industrialização da entidade (...)”. Para isso a Cooperativa teve que investir em máquinas e equipamentos como: tachas para a fabricação de doce de leite, câmaras frias, máquina formatadora de mussarela e uma completa reestruturação no sistema hidráulico e elétrico do laticínio. Mas o grande problema seria o mercado consumidor para tanto leite e derivados. Para tanto foi contratada uma empresa de revendas, a Comercial Nordeste, para facilitar a introdução dos produtos Rádio em Goiânia e Brasília:

            Segundo o diretor proprietário desta empresa, Haroldo Parrião da Fonseca, ‘embora tecnicamente estejamos numa das melhores praças para consumo de produtos laticínios do Brasil, para se conseguir implantar nova marca no Centro-Oeste é necessário uma arrojada estratégia, que começa por uma maciça campanha publicitária e vai até uma série de benefícios dirigidos aos distribuidores e proprietários de padarias.”55

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55 Revista Cooprata, Jan/1988, n.º 19. Uberlândia: Expediente, p. 04.



Segundo a Revista Cooprata o nome Parião é estranho, mas a figura é extremamente simpática. Ele lembra que a região Centro-Oeste tem sido “invadida” com freqüência por “muitos picaretas” que se propõem a fazer uma distribuição de leite em larga escala, mas que acabam, em pouco tempo, paralisando suas atividades, “deixando os comerciantes que distribuem os produtos na mão.” Mas, para favorecer as vendas, a Cooprata contratou a agência “Qualidad” – Uberlândia, de propriedade de Narcio Rodrigues da Silveira, que disse que a principal preocupação da agência naquele momento era a de desvincular a marca “Radio” da palavra ‘radiotividade”, que estava ligada à maior tragédia acontecida em Goiânia nas últimas décadas: a radiação pelo césio, no ano anterior:

            “A preocupação foi a de demonstrar que o leite tem sabor integral e é a pureza do Triângulo atendendo estas duas capitais: (...). A produção VT de 30 segundos (...) é feita com a imagem de um palhaço, de roupa colorida, que desliga um rádio antigo e se volta para o vídeo, gritando. ‘Olá, garotada. Quando eu era criança, minha mãe deixava eu ligado no rádio. Mas é neste rádio aqui, ó! (...)”56



            Para ajudar nesta estratégia, a Cooprata preparou uma campanha de lançamento do produto na TV Globo de Brasília e na TV Anhanguera, de Goiânia, um anúncio de 30 segundos, apresentando o Leite Rádio, juntamente com os demais produtos da Cooprata, que começou a ser veiculado nestes canais no dia 20 de janeiro de 1988. Mas apareceram logo dois problemas para o leite no mercado centro-oeste: o primeiro de uma sobre taxa de 17% nos produtos vindos de Minas Gerais e, o outro, de uma portaria, em nível federal, que determinava que o leite tinha que ser empacotado no mesmo dia da ordenha e ainda distribuído para o mercado de vendas, o que impossibilitaria a sua distribuição a tempo em Brasília.

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56:Idem, p.08.



A Cooperativa foi encontrando muitas dificuldades: talvez se ela tivesse tomado aulas com Jack Correa, citado em Caros Amigos por Marina Amaral, em artigo “Coca x Dolly, uma guerra sem refresco”, seus problemas tivessem sido resolvidos, e o lobista explica porque a Coca-Company mantém um escritório e um vice-presidente em Brasília, apesar de suas operações estarem concentradas em Manaus e no Rio:

            “A questão chave é o peso que a empresa dá à questão do relacionamento com o governo. Montar uma estrutura em Brasília requer uma perspectiva de longo prazo. É preciso não só conhecer as pessoas, mas criar vínculos com elas. Desembarcar em Brasília sem conhecer bem a pessoa com quem vai falar, sua história de vida, sua linha de ação, é complicado, perigoso e caro. No caso de ter que mudar uma legislação danosa para a empresa, quem não é conhecido, quem não está lá mostrando a cara, quem não tem o que dizer ficará eternamente de longe admirando o que está acontecendo. Há consultorias em Brasília de profissionais egressos da Receita. Eles conhecem todo mundo, sabem todos os caminhos. O erro é ir direto sem conhecer a pessoa”.57



            Foi o que aconteceu com o leite da Cooprata, logo que ele chegou na Capital Federal surgiram os boatos colocando em dúvida a qualidade do leite. Afirmavam que o produto estava com qualidade prejudicada, que a Inspeção Sanitária tinha descoberto ítens que desqualificavam o produto. Resultado, foi preciso a Cooprata abandonar o mercado com grande prejuízo. Encontramos na Revista Cooprata de julho/88 o seguinte texto:

            “Segundo o assessor da Cooprata, enconomista João Vieira Fernandes, a questão da dívida da entidade não deve ser motivo de alarde para o cooperado. A entidade tem um faturamento bruto médio de Cz$ 180 milhões mensais e um patrimônio de mais de Cz$ 2 milhões capaz de garantir qualquer credor, destaca o economista, lembrando que a dívida da empresa não chega a 4% deste total”.58

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57 AMARAL, Marina. Coca x Dolly. Caros Amigos, Ano VIII, n.º 86, maio/2004, p. 30.
58 Revista Cooprata, Jul/1988, n.º 21, p. 02.






Desde então a Cooprata, apesar de ter diversificado sua produção de derivados do leite, não mais se preocupou em conquistar mercados. Resultado disso é a queda no empacotamento no leite tipo C: 1999 – 2.832.000, 2.000 – 1.459.473, 2001 – 909.568, 2002 – 806.560, 2003 – 700.000.

            Apesar dessas dificuldades enfrentadas pela empresa, do ponto de vista do processo capitalista de produção o seu faturamento atesta o seu sucesso, apesar dos problemas com o mercado, e as diretrizes confirmam a opção das diretorias pela política de produtividade. Os relatos dos pequenos produtores, no entanto, vão nos indicando como eles vão sendo afastados desse processo e como a ideia de “ajuda mútua a que todos se obrigam” resulta na diferenciação cada vez maior no interior da cooperativa.





Ordena manual.






 CAPÍTULO 3

ESTRATÉGIAS E RESISTÊNCIAS DOS COOPERADOS



“(...) o propósito da História não é o de “desencavar” o passado para apenas descobrir as raízes de nossa identidade, mas o nosso compromisso de construir a transformação do presente”. 59




            Monteiro Lobato descreve o homem do campo brasileiro como sendo um roceiro caipira que precisava ser orientado para sarar suas doenças e produzir mais, como era o caso do Jeca Tatu. Esse personagem ficou conhecido no Brasil todo, por ser apresentado em propaganda do estimulante de apetite, Biotônico Fontoura, que encontramos até hoje nas prateleiras dos supermercados. Com o intuito de promover essa orientação, a Cooperativa do Prata criou em 1995 os Núcleos Educativos e, em 2000, foram criados os Dias de Campo, para incentivar a produtividade do pequeno produtor.

            Mas a diretoria da Cooprata, desde 1988, já havia criado comitês educativos e contratado uma tecnóloga em cooperativismo, formada pela Universidade Federal de Viçosa, para orientar e assistir os cooperados. Na revista Cooprata ela comenta seu trabalho:

Esse trabalho será desenvolvido a partir do crescimento das comunidades (...) Por serem pessoas da área rural, pessoas mais recatadas, se inibem, não manifestam, estando ou não satisfeitos com a diretoria, e com a organização das comunidades, haverá mais possibilidades de debater, trocar ideias e desenvolver o hábito de falar e eleger um representante. É um trabalho a longo prazo, pois esta região é muito distante, muito extensa”. 60
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59 FENELON, Déa Ribeiro. O Historiador e a Cultura Popular: história de classe ou história do povo. História & Perspectivas, n.º 23 jan/jun. 1992, Universidade Federal de Uberlândia; p. 10
60 Revista Cooprata, jun/1988, n.º 20. Uberlândia: Qualidad. p.14
 























O que muitas vezes acontece com o produtor rural e o faz se sentir constrangido, não manifestar seu pensamento, é sentir-se num ambiente diferente do seu, onde é usado um linguajar difícil para ele. Como nos disse o Sr. João Camilo de Souza: “Eu sempre falo, eu divia ter estudado mais um ano, pra dar lição em muita gente. Por  a gente ser analfabeto não tem condição de  dar   uma lição nos cara, né?” 61





        É interessante ressaltar que tanto os pequenos produtores como os grandes têm consciência que seus interesses são conflitantes. Antônio de Almeida; em artigo onde analisa os trabalhadores e seus espaços, ressalta a pertinência das noções de classe e luta de classes para o entendimento das relações sociais contemporâneas. Lembrando Thompson, o autor afirma:

            “Entendo, como Thompson, que quando as pessoas se encontram num determinado contexto social, experimentam concretamente a exploração que pode estar situada no interior das relações de produção ou  em outros espaços., elas identificam interesses que são antagônicos aos seus, começam a lutar contra esses interesses, no processo da luta, se descobre enquanto classe”.62










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61 Entrevista: João Camilo de Souza. 66 anos, casado, em 09/02/04
62:ALMEIDA, Antônio. Os trabalhadores e seus espaços: Cultura, Experiência e cotidiano nos Estudos Históricos sobre Identidade Coletiva. Machado, Maria Clara T. e Pariota, Rosangela (org). Política, Cultura e Movimentos Sociais: contemporaneidade historiográficos. Uberlândia: EDUFU, p. 37.





        Procuramos também entrevistar grandes produtores de leite, como é o caso do produtor Sérgio Medina Coeli, que tira mais de 700 litro/dia. Fizemos a seguinte pergunta: - O que você tem observado, enquanto cooperado, todos são tratados igualmente?:




“O cooperativismo só funciona, quando todos os cooperados são tratados iguais, esse é o princípio do cooperativismo, tanto que independente do tamanho do produtor o seu voto tem o mesmo valor independente do número de cotas que ele têm. Nós somos todos iguais perante a Cooperativa. É lógico que existe uma diferença de tratamento pelo custo da produção e isso foi muito difícil de incutir na cabeça do cooperado, que o transporte do leite é um preço para quem tira 1000 litros e para quem tira 50 litros. O frete é muito diferente do preço. Então hoje a Cooperativa adota esse sistema de preço diferenciado pela produção e pela qualidade também do produto, porque não adianta produzir grande quantidade, com má qualidade. Isso aí foi um trabalho que foi feito de conscientização do produtor. E hoje já é bem aceito, mas houve, no início muita reação contrária (...) as comunidades rurais tem dado uma força muito grande para a Cooperativa e essas comunidades tem sido escalas de cooperativismo. Ali o cooperado participa, lá no meio do mato com mais liberdade. Lá no mato eles participam melhor, eles falam tudo que precisam falar e é interessante, que a maioria das reclamações são infundadas, mas tem oportunidade de alguém sempre esclarecer e a Cooperativa tem diretores  que  participam dessas reuniões, mas  eles procuram não participar dos esclarecimentos, se tiver algum cooperado presente em condições de dar os esclarecimentos, eles deixam a discussão ficar a nível dos cooperados. Só quando é necessário que eles dão os esclarecimentos, mas quase sempre eles mesmos, entre eles chegam às conclusões de que muita coisa está justamente errada e as comunidades fazem as propostas (...)”63  






            Podemos constatar que o que o grande produtor quer “incutir na cabeça” do pequeno é justamente os mesmos ensinamentos da Cooperativa. Aparentemente não existe diferença entre os maiores produtores e a Cooperativa, a não ser entre grupos rivais que geralmente disputam poder.

No início do livro, Como as Instituições Pensam, a autora Mary Douglas escreve: “Escrever sobre cooperação e solidariedade significa escrever ao mesmo tempo sobre rejeição e desconfiança (...)”64. A Cooperativa é uma instituição que  retrata o pensamento dos grandes produtores. As relações estão carregadas de termos pejorativos como na fala do Sr. Medina: “Ali o cooperado participa, lá no meio do mato com mais liberdade. Lá no mato eles participam melhor (...)”65. As estratégias são bem elaboradas, deve-se deixar que as discussões corram entre os cooperados, só interferindo em último caso.

            O Sr. João Camilo sabe que, embora ele não fale muito bem, ninguém vai defender os seus interesses. Perguntamos a ele: - Sr. João, mas ainda tem que levantar na reunião quando não concorda com uma votação? Resposta:

            “Tem, tem que levantar, muitos fica sem graça de levantar, tem que ser na votação (voto secreto). O companheiro quer levantar mais fica acanhado, né? O pobre não tem regalia. Eu sou pobre, mais sou um pobre despachado. Eu não têm não..., o que eu tiver de falar eu falo pra quarqué um. Eu nunca tive sisma de home. O que eu sinto a vontade... Você ta classificado num negócio, você não vai reclamá quem vai reclamá pro ce? Ninguém, né? Têm que ser você mesmo (...)”66



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63 Entrevista: Sérgio Medina Coeli, 50 anos, 3 filhos, 29/01/04.
64 Douglas, Mary. Como as Instituições Pensam (trad. Carlos Eugênio M. de Moura), São Paulo: Editora da Universidade de S. Paulo, 1998, p. 15
65 Entrevista citada: Sérgio Medina, 29/01/04
66 Entrevista: Sr. João Camilo de Souza, 09/02/04

 













            Com esta fala do Sr. João Camilo podemos perceber um conflito latente dentro da instituição. Lembramos E.P. Thompson, quando ele aponta que:

“(...) teremos de reconhecer que a História não é apenas o registro de transformações neutras e inevitáveis, mas é também o relato de exploração e da resistência à exploração e que os valores permanecem, até serem aceitos ou rejeitados”.67



            O Sr. João Camilo foi um dos 200 associados que deixaram a Cooprata depois que foi exigida a compra do tanquinho: “Eu saí porque as coisas foi modificando cada dia mais, tinha que comprar esse tanquinho, né? A gente não tem condição, a Cooperativa não dá condição. Só dá condição pro rico, pro pobre não dá”.68

            Para aumentar a participação e o interesse do cooperado para com a Cooprata, em 2002 foi contratada uma agente comunitária, Marilene Rezende Vilela. Do seu trabalho, foram consideradas como prioridades:

§         Planejar as reuniões das nove comunidades.

§         Trazer sugestões e reclamações à administração da Cooprata.

§         Transmitir as resoluções administrativas aos cooperados.

§         Integrar a família do associado a Cooperativa.

§        Incentivar a união, a harmonia e a participação dos associados69.



Atualmente existem nove comunidades da Cooprata: Monjolinho, Pramonte, Bela Cruz, Boa Vista, Da Prata, Três Barras, Bom Jardim, Douradinho e Urbana. As reuniões são realizadas geralmente à noite, oferecem jantares ou lanches, sorteio de brindes e terminam com orações.70. Essas orações são usadas estrategicamente para ser elo de ligação entre os associados e os agentes comunitários. A oração nos coloca como filhos de um mesmo pai e, portanto, todos irmãos.




      No dia 15 de maio de 2002, a comunidade Bela Cruz se reuniu na capela da Imaculada Conceição em orações. “A comunidade dá o exemplo de que o homem não caminha na graça, se não estiver em comunhão com Deus.”71















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67 THOMPSON, E.P., O tempo a disciplina do trabalho e o capitalismo industrial. In: SILVA, Tomaz (org) Trabalho, Educação e Pratica Social. Porto Alegre: Ed. Artes Médicas, 1991.
68 Idem, p. 17
69 Revista: Cooprata Edição Especial 2000/2002. Uberlândia: Expediente, p. 16
70 Idem, 16
71 Informativo Cooprata, Ano/IV, N: 52, jun/2002. Uberlândia: Expediente, p.8








            Fizemos a seguinte pergunta ao Sr. Sérgio Medina – Essas reuniões são para melhorar a produção de leite? Sr. Sérgio:










“- Não só melhorar a produção, também têm esse aspecto, mas também para melhorar o conhecimento do cooperado inclusive com educação para família, educação para o cooperativismo, religiosidade que normalmente têm independente da religião do cooperado, sempre têm, uma participação religiosa que funciona muito bem e deu muita força para a cooperativa.”72


            Para Weffort, a religião é o espírito da sociedade burguesa. A democracia política é cristã na medida que ela separa o homem do próprio homem: “não o homem culto nem o homem social, o homem na sua existência acidental como tal, o homem que se corrompeu por toda a organização de nossa sociedade, perdido de si mesmo, alienado, (...)”73. Certamente não no cristianismo primitivo que começou a ser difundido por todo Império Romano pelos primeiros apóstolos, como é o caso da citação que fazemos, no início do segundo capítulo. É desse cristianismo que nasce a ideia de cooperativismo e de comunismo. Então podemos fazer uma analogia, o cristianismo que traz a ideia de cooperativismo, este historicamente modificado pode ser usado para doutrinar os seus associados.

            Com as mudanças e com este novo “caminho da modernidade”, a cooperativa já não mais se preocupa com o produtor, mas com a produção: “A granelização do leite aumentou o volume de leite recebido de 120 mil litros para 160 mil litros de leite/dia, mesmo com a redução de sócios de 800 para 660”74. O que transparece na atual política é que se o produtor não consegue acompanhar as mudanças é problema dele. A Cooperativa não está mais atrás de associados, mas só de “bons cooperados” , ou seja, quem produz muito leite de boa qualidade.



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72 Entrevista: Sérgio Medina, 29/01/04
73 WEFFORT, Francisco. (org) Os clássicos da política. São Paulo: Ática, V.2, p. 252.

74 Revista: Cooprata. Edição Especial 2000/2002, p. 3


O relacionamento cooperado/cooperativa tem sido motivo de reclamações por parte dos pequenos produtores:

O Braquiara (Adelino José P. Neto, presidente) para mim o atendimento dele é só pros ricos. Ele oia só prós ricos. (...) quando a gente vai lá pra conversar com o Braquiara, a gente entra com uma cara, às veiz meio alegre, e sai quais chorano. O atendimento dele é muito ruim pro pequeno, ele não faz carreira nenhuma, que agrada o pequeno. Ele só desagrada o pequeno. (...) Eu cheguei lá asturdia e falei pra ele: - Braquiara a minha energia vai cortar, eu preciso de R$ 60,00, meu dinheiro não dá pra pagar a energia, me arrume R$ 60,00. Ele respondeu depressa, mais que depressa ele respondeu: - Nóis num pode emprestar dinheiro.
            Diz ele que a Cooperativa não tem condição de emprestar dinheiro. Aí eu ri na cara dele e sai. (...) Mas o Braquiara não vale nada, pra mim ele nem existe na Cooperativa. Se ele ficar lá quatro anos, eu vou ficar quatro anos sem entrar na sala dele.”75



            A Cooperativa às vezes faz pequenos adiantamentos para o produtor que está precisando. Pessoas simples como o Sr. Jair só costumam recorrer a esses recursos em último caso. O corte da energia elétrica poderia ocasionar a perda do leite do tanquinho, por isso tamanha decepção do Sr. Jair com o presidente em exercício, Adelino Neto. Mas o que está deixando indignados os pequenos produtores é o distanciamento da empresa dos seus sócios. Todos são unânimes em enaltecer diretorias do passado, sem entender que o que tem mudado é a nova política da instituição. O Sr. João Amâncio, perguntado se a Cooperativa o havia ajudado na orientação da alimentação das vacas, respondeu: “No tempo dos outros diretor, o Hugo (Presidente1980/1983), aqueles ajudava demais. Mas depois que passou esses, não tem ajuda não. A ajuda deles é muito fraca. Eles ajuda mais pro lado dos fortes. Pro lado fraco não”76. O Sr. Jair também manifestou seu saudosismo pelas diretorias passadas. Perguntamos pela construção do silo: “Tô fazeno, (...)”. Continuou falando das dificuldades do pequeno produtor e depois acrescentou:

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75 Entrevista: Sr. Jair Lima Arantes, 63 anos, 09/02/04
76 Entrevista: Sr. João Camilo de Souza, 09/02/04

 











“Cume que o coitado do pequeno vai vivê. Ele tá com a Cooperativa, mais a Cooperativa num tá com ele. Por causa às veiz da diretoria. Mais já teve direto bão demais, teve o Neilton (Diretor Comercial, 1977/1980), o Riel (D. Presidente, 1989/1992), teve aquele “menino” da “padaria”, o Durval (D. Presidente, 1993/1995), e assim teve mais uns, o Hugo (citado pelo Sr. João). É umas pessoas boas. O Hugo ocê chegava lá, ocê mandava, ocê comprava ração, ocê falava: Hugo eu preciso de tantos sacos. Hoje num tem jeito. Mais tem jeito sim, porque cume que faiz? Cume que ocê vai tratá do seu gado? Cume que ocê vai mantê seu leite? O Hugo buscava jeito”77.



            Observamos os entrevistados mostrando uma Cooperativa diferente no passado e condenando as diretorias atuais como culpadas pelas dificuldades dos pequenos produtores (É uma característica de nós brasileiros que acreditamos que trocando o Presidente da República teremos uma nova nação). Constatamos que realmente há uma política na Cooprata, valorizando a produção e consequentemente um desmerecimento do pequeno produtor.

            O Sr. Jair quando se refere a um dos dirigentes da Cooperativa, Durval Vieira Alves, o denomina de “menino da padaria”, e ele tem mais de cinquenta anos (Muitos pais referem a seus filhos já de idade como meninos). O Sr. Jair pode ter lembranças do menino, ou pode considerar que  dez anos atrás, quando ele foi presidente, era bastante jovem.

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77 Entrevista: Sr. Jair Lima Arantes, 09/02/04
78 PORTELLI, Alessandro. Entrevista: História oral e memória. In: História & Perspectivas. Uberlândia, EDUFU, 25/26, 2001, p. 50
79 Idem, p.41
 

            É a memória fazendo suas escolhas, nos dizeres de Alessandro Portelli: “Ela é a questão da memória fragmentária: o que de fato faz sentido é o sentido em si mesmo”78. Durval antes de ser presidente da Cooprata não tocava mais a padaria. (Muitas pessoas ainda o chamam assim: Durval da padaria). Mas a história oral é uma história construída em torno de pessoas. Ela lança a vida para dentro da própria historia: “a questão não é tanto o que ocorreu, mas como foi recordado o que ocorreu, que é o fato histórico mais importante, seguramente”79. Portelli, conhecedor da história oral, chama atenção para o que o historiador deve resgatar do conteúdo da entrevista.









            A história oral tem de lidar com testemunhas vivas, presentes no momento. É uma história presente cujo: “objeto de estudo do historiador é recuperado e recriado por intermédio da memória dos informantes”80. Nossa capacidade de ouvir baseia-se na consciência de que praticamente todas as pessoas que entrevistamos enriquecem nossa experiência. “Fontes orais contam-nos não apenas o que o povo fez, mas o que queria fazer,
fazendo e o que agora pensa que fez”81.

            Quando começamos a fazer pesquisas orais sobre a história da Cooprata, estabelecemos uma trajetória e acreditávamos chegar a mais ou menos em algumas conclusões, que pareciam óbvias. Com o trabalho de campo muitas trajetórias foram abandonadas e as “conclusões óbvias” acabaram por ficar sem valor. Surgiram novos problemas e, a cada entrevista, tomávamos novas direções. Para se ter uma idéia não sabíamos da resistência à granelização obrigatória.
            A história oral deve ser analisada com muito cuidado, porque está subjetividades das experiências vividas. É preciso estar atento a todas as possibilidades: “a arte essencial do historiador oral é a arte de ouvir”82. Devemos estar atentos ao comportamento humano e à cultura do entrevistado.

            Perguntado, o Gerente Administrativo da Cooprata, Valdenir Gouveia de Moura, se a mudança para o tanquinho com o sistema de granelização do leite pelo laticínio, havia trazido benefícios a todos os produtores, nos respondeu:

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80 FERREIRA, Marieta de M., AMADO, Janaína. In: Uso & Abuso da História Oral. Rio de Janeiro: Editora da Fundação G. Vargas, 1998, p. 15
81 PORTELLI, Alessandro. O que faz a história oral diferente. Trad: Maria Therezinha J. RIBEIRO, Revisão: Dea Ribeiro FENELON. In: Projeto História. História e Oralidade. 500 Paulo: EDUC, n.º14, 1997, p. 31.
82 PORTELLI, Alessandro. Tentando Aprender Um Pouquinho: Algumas reflexões sobre a ética na História Oral. In: Projeto História, História e Oralidade. São Paulo: EDUC, n.º15, 1997, p. 22

 











































“Sim, porque quando a Cooprata ganha ela repassa isso para o produtor. A Cooperativa tinha três plataformas, duas foram fechadas, hoje só tem uma. O que a Cooperativa reduziu em funcionários (...). Num primeiro momento, muita gente achou que aquele negócio era ruim, que a Cooperativa estava penalizando o pequeno (...) A Cooprata economizou na mão-de-obra, na limpeza, ela gastava muito. Além dessa economia, para os dois lados, nós hoje temos um leite de qualidade muito melhor do que o leite que a gente tinha (...). A Cooperativa do Prata, já tem atendido a qualidade que a portaria pede para 2007, nós já estamos com o padrão de qualidade, nós já saímos na frente.
O nosso leite hoje já tem condições de exportar (...). Mas muitos produtores não queriam o negócio. Seria mais ruim pra eles. Agente começou a trabalhar com isso. Eles não ganhariam 50% do frete. Em cima disso a gente começou e aquele negócio foi crescendo e muitos cooperados foram aderindo. Chegou um ponto que quem não colocou não ia colocar mais, naquele momento a gente parou, não ia pegar mais leite no latão. Se a gente continuasse tinha gente entregando no latão até hoje. (...)”83



            O objetivo da Cooperativa com o tanquinho é o de adequar ao mercado: reduzindo a mão-de-obra e as despesas em geral. A medida do governo é ainda para o ano de 2007. E o Brasil importa leite e não o contrário.

            A primeira estratégia da Cooperativa foi fazer uma campanha publicitária, no Informativo Cooprata: “O vasilhame de lata colocado à beira da estrada, na frente da porteira da fazenda, que até agora vinha sendo o símbolo do atraso da pecuária leiteira em nosso País está sumindo da paisagem do interior”84. A segunda estratégia foi propor um benefício para o produtor que passasse para o tanquinho, um desconto de 50% no frete.

            Muitos ainda resistiram, os motivos eram diversos, a maioria pelo custo do tanquinho, outros por falta da energia elétrica, outros por falta de espaço físico (uma casinha) para instalar o tanquinho. Alguns poderiam ser por puro conservadorismo, mas teríamos que continuar as entrevistas. Enquanto eles continuavam resistindo e insistindo em entregar o leite nos latões, formavam um grupo de resistência com mais ou menos 200 cooperados. Depois da decisão da Cooperativa de não mais recolher o leite deles, passado algum tempo alguns voltaram para a Cooperativa, comprando o tanquinho.

            A Cooperativa com o tempo vai amoldando seus métodos de orientar o cooperado para uma maior produção. Assim nos relatou Valdenir G. de Moura:


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83 Entrevista: Valdenir Gouveia de Moura, 46 anos, Gerente Administrativo, 25/10/03
84 Informativo Cooprata. Ano II, n.º 19, set/99. Uberlândia: Expediente, p. 05





“Quando a gente queria mostrar uma coisa pro produtor, a gente pegava o produtor levava ele fora, para visitar uma outra fazenda noutra região e a gente começou a perceber que muitas vezes o produtor voltava animado, voltava desanimado. Ele chegava lá, a estrutura era muito grande, era um negócio muito diferente, ele não tinha como fazer isso. O que que a gente passou a fazer? A gente passou a fazer dia de campo aqui na região. A gente pegava um pequeno produtor. O técnico nosso ia pra lá, treinava aquele produtor, fazia ele produzir em cima da técnica pra que ele tivesse a produção muito grande. Pegava os produtores do município e levava lá pra ver aquele produtor que eles conhecem, mostrava pra eles que o negócio foi feito (...). Então era uma novidade interessante, o produtor chegava lá, via se fulano deu conta de fazer isso eu também vou dar conta de fazer (...)”85



            Entre os cooperados, sendo conhecidos, cria-se um sentimento ao mesmo tempo de identidade e competição, como no concurso de leite, onde é gratificado o vencedor com prêmios e troféu.

            Trabalhamos com poucas entrevistas, escolhendo as mais diferentes entre si e, por meio delas, procuramos avaliar e explicar possibilidades na realidade social da Cooperativa. Procuramos destacar os sujeitos: “Como pessoas vivas, que se fazem histórica e culturalmente, num processo em que as dimensões individual e social são e estão intrinsecamente imbricadas”86.

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85 KHOURY, Yara Aun. Narrativas Orais na Investigação da História Social: In: Projeto História, História e Oralidade. São Paulo: EDUC, n.º 22, 2001, p. 80





CONSIDERAÇÕES FINAIS



            O cooperativismo se torna dia-a-dia mais incompatível com o capitalismo que exclui os laços de solidariedade e os sentimentos de fraternidade. Os produtores são entendidos sem as suas subjetividades, apenas são medidos pela sua produção. Os que mais produzem são louvados, os que pouco produzem devem se adequar à sociedade, ou seja, aumentar a sua produção.

            Quando se aumenta o preço do leite de quem mais produz, não se está pensando em recompensar “o bom” produtor, mas punir “os maus”. Os pequenos produtores são entendidos como aqueles que precisam de orientação.

            A Cooperativa sente-se no direito de determinar o que e como o produtor deve produzir. Considera-se prejudicada se o produtor diversificar sua produção, por exemplo, como plantar outras culturas que não sejam para alimentar o gado. Há essa preocupação porque tudo é medido pelo lucro, quem produz menos tem um custo maior na sua produção. O produtor que tira muito leite em sua fazenda dá uma despesa menor para a Cooperativa na hora de transportar e processar o seu leite do que um sitiante que produz pouco leite, por isso a discriminação. O discurso é esse, mas é falacioso porque a diferença no transporte é mínima, as fazendas são próximas umas das outras, numa mesma região. O mesmo caminhão que recolhe o leite de uma apanha o leite de todas as fazendas daquela região. O que se busca é motivo para justificar as diferenças de preço. O capitalismo cria instrumentos de exploração utilizando o sentimento da cooperação.

            Não tivemos oportunidades de pesquisar mais e melhor as revistas informativas da Cooprata, mas percebemos pelas gravuras que o tirador de leite lá da fazenda vai, com o passar dos anos, desaparecendo de suas páginas. Nas revistas novas encontramos nas fotografias reuniões de associados, reuniões nas comunidades e muitas máquinas. Não aparecem mais as fotos dos produtores lá na fazenda.

            Esse trabalho nos apresentou diversos questionamentos que não resolvemos. Isso nos aponta para uma continuidade da pesquisa, para tentar responder a muitas outras perguntas. Com o contato estabelecido com os produtores, outras fontes começam a aparecer e elas não foram analisadas nessa monografia. Um exemplo são as fotografias, que aqui entram apenas como ilustração, mas que abrem possibilidades de análise sobre as experiências dos pequenos produtores no município do Prata.

            Nesse sentido, essa monografia corresponde a uma etapa de uma pesquisa que se pretende mais profunda.




                                      FONTES




REVISTAS:

¨      Informativo Cooprata, Ano VI, n.º 69, jan/2004. Uberlândia: Expediente;

¨      Informativo Cooprata, Ano V, n.º 66, out/2003. Uberlândia: Expediente;

¨      Cooprata. Edição Especial, 2000/2002. Uberlândia: Expediente;

¨      Informativo Cooprata, Ano IV, n.º 52, jun/2002. Uberlândia: Expediente;

¨      Informativo Cooprata, Ano III, n.º 45, nov/2001. Uberlândia: Expediente;

¨      Revista Cooprata, dez/1999. Uberlândia: Expediente;

¨      Informativo Cooprata. Ano II, n.º 19, set/99. Uberlândia: Expediente;

¨      Informativo Cooprata, Ano II, n.º 18, ag/99. Uberlândia: Expediente;

¨      Revista Cooprata, Ano 1, n.º 3, nov/97. Uberlândia: Expediente;

¨      Revista Cooprata, Ano 1, n.º 1, ag/97. Uberlândia: Expediente;

¨      Revista Cooprata, mar/1992. Uberlândia: Joça Publicações;

¨      Revista Cooprata n.º 20 jun/1988. Uberlândia: Qualidad;

¨      Revista Cooprata, dez/1987, n.º 18. Uberlândia: Qualidad;

¨      Revista Cooprata, 1986. Uberlândia: Qualidad;

¨      O Cruzeiro. Rio de Janeiro, 10/04/1969;

¨      Caros Amigos. Ano VIII, n.º 86, mai/2004. Rio de Janeiro: Casa Amarela.



FOTOGRAFIAS:

¨      Arquivo do Departamento de Educação e Cultura;

¨      Informativo Cooprata.



DOCUMENTOS:

¨      Estatuto Cooprata, nov/2002;

¨      Estatuto Cooprata, fev/1999;

¨      Estatuto Cooprata, set/1983;

¨      Estatuto Cooprata, set/1977.



FONTES ORAIS:

¨      João Camilo de Souza, 66 anos, pequeno produtor, média 50 l/dia, não produz para a Cooprata, residente no sítio. Entrevista realizada em 09/02/04;

¨      Jair Lima Arantes, 63 anos, pequeno produtor, média 50 l/dia, residente no sítio. Entrevista realizada em 09/02/04;

¨      Maria Batista Rodrigues Teodoro, 38 anos, produz 200 l/dia, residente no sítio. Entrevista realizada em 09/02/04;

¨      Pedro Queiroz Assunção, 83 anos, sócio fundador, residente em Prata, continua fornecendo leite para a Cooprata. Entrevista realizada em 09/02/04;

¨      Riel Morais da Silveira, 57 anos, produtor com média de 200 l/dia, foi diretor presidente em 1989/1992. Entrevista realizada em 10/01/04;

¨      Sergio Medina Coeli, 52 anos, produz média de 700 l/dia, residente em Prata. Entrevista realizada em 29/01/04;

¨      Valdenir Gouveia de Moura, 46 anos, trabalha como gerente administrativo na Cooprata. Entrevista realizada em 10/10/03.






                                 BIBLIOGRAFIA




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